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| Papa não foge de temas polêmicos e já debateu sobre capitalismo, crise mundial e homossexualismo |
"Vós sabeis que o dever do Conclave era dar um Bispo a Roma. Parece que os meus irmãos Cardeais tenham ido buscá-lo quase ao fim do mundo." Foi assim, de forma humilde e brincalhona que o argentino Jorge Mario Bergoglio começou seu papado há um ano, após ser eleito no segundo dia de votação no Vaticano para ocupar a vaga de Bento XVI, que assustou o mundo católico com a renúncia no mês anterior.
Em apenas um ano, Papa Francisco mudou a imagem da Igreja Católica, então marcada por escândalos no banco do Vaticano e denúncias de pedofilia. O novo pontífice promoveu uma revolução pacífica, com linguagem direta e simples e maior proximidade com os fiéis. Seu discurso mudou o foco das lentes e sua oração do ângelus, por exemplo, tornou-se o programa de maior audiência nas manhãs de domingo na TV italiana.
O novo papa surpreendeu já na primeira aparição pública: sem a estola vermelha, apenas com batina branca e crucifixo de ferro. Depois, curvou-se e pediu que a multidão orasse por ele. E seguiu uma série de novidades: primeiro papa latino-americano, primeiro pontífice jesuíta e o primeiro "Francisco" no comando da Igreja, numa referência direta a São Francisco de Assis.
O que seguiu foi uma série de atitudes inusitadas. Recusou o carro de luxo oficial, privilégios de chefe de estado e circulou em veículo comum. No dia seguinte à eleição, voltou de ônibus para pagar a conta na Casa Santa Marta onde estava hospedado. Dias depois sentou-se discretamente no fundo de uma capela para assistir a missa junto de funcionários do Vaticano.
Essa proximidade chegou também nas redes sociais. Usuário frequente do Twitter, o santo padre postou nesta quinta-feira com uma mensagem simples e humilde: "Rezai por mim", disse simplesmente há uma hora (horário de Brasília).
Além da mudança de postura, Francisco desencadeou uma grande reforma na estrutura administrativa e econômica no Vaticano. Criou uma espécie de ministério da Economia, com uma equipe mista internacional de cardeais, bispos e especialistas auditores, de modo a acabar com o ancestral centralismo e favorecer a transparência financeira e administrativa.
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| Pontífice segura pomba durante audiência na Praça de São Pedro |
Francisco impulsionou um gigantesco debate sobre a família, convocou dois sínodos, enviou um questionário aos bispos sobre as "novas formas de família", razão pela qual são esperadas importantes decisões sobre o tema em médio prazo. O papa promulgou uma encíclica sobre a Fé, cujo conteúdo já havia sido iniciado por Bento XVI. Numa espécia de "plano de governo", publicou uma exortação apostólica sobre o "anúncio do Evangelho no mundo atual".
"Em seu primeiro ano de pontificado, Francisco mostra um horizonte profético para a Igreja, num período de transformações aceleradas e de grandes questionamentos, que exige novos caminhos na missão de anunciar o Evangelho", afirma dom Walmor Oliveira de Azevedo, arcebispo de Belo Horizonte. "Reúne toda as condições e competências para conduzir a Igreja, atributos adquiridos durante a rica experiência pastoral, especialmente junto aos mais pobres e sofridos", completa.
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| No Rio de Janeiro, Francisco saúde multidão que se aperta na rua |
Mas, onde andava essa liderança que nunca foi citada entre os favoritos para suceder Bento XVI? Mesmo com o segredo do conclave, vazou uma informação que o cardeal argentino já havia sido bem votado em 2005, surgindo como nome forte em 2013. "O fato de substituir um papa que renunciou exigiu uma real mudança. Bergoglio seria uma alternativa diferente aos outros cardeais, principalmente por conta da forte adesão da Igreja no continente latino-americano. Esses sete anos serviram para amadurecer ainda mais essa opção por ele", analisa dom Luiz Gonzaga Fecchio, bispo-auxiliar de Belo Horizonte.
PAPA FRANCISCO EM OITO IMAGENS:
1. O então arcebispo de Buenos Aires já era conhecido por ter uma vida simples, mesmo como cardeal. Costumava usar o transporte coletivo em suas visitas pastorais e, quando em Roma, preferia hospedar-se na casa dos Jesuítas.
2. A escolha para papa em 13 de março de 2013 surpreendeu o mundo. Primeiro pontífice latino-americano apareceu na sacada do Palácio apenas com batina branca e cruz de metal.
3. Papa assiste missa discretamente numa capela. No dia seguinte à eleição, transitou pelo Vaticano de ônibus com os outros cardeais. Fez questão de pagar a conta na casa onde estava hospedado.
4. Papa Francisco chega ao Brasil para a Jornada Mundial da Juventude e o carro acaba ilhado por uma multidão de pessoas
5. Pontífice beija criança durante encontro no Rio de Janeiro. Proximidade com o público é uma das marcas registradas do papa.
6. O papa Francisco interrompe audiência geral em 6 de novembro de 2013, na praça São Pedro, no Vaticano, para consolar um homem doente.
7. Francisco visita o papa-emérito Bento XVI, o "avô-sábio" como costuma chamá-lo. Encontro de dois papas é uma imagem até então inimaginável
8. Francisco se apresenta como uma pessoa extrovertida, brinca com animais e adora receber presentes dos fiéis
Visita ao Brasil e temas polêmicos
Uma prova de fogo para o novo papa foi a viagem ao Brasil, durante a Jornada Mundial da Juventude, em julho de 2013. Ele atraiu multidões de jovens e conquistou admiradores que sequer esperavam se deixar seduzir por seu carisma. É a 'Franciscomania".
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 O Papa é Pop |
Novamente, dispensou carro de luxo e transitou com um modelo mais simples. Na frente do público, só em carro aberto. Visitou favelas, abraçou fieis, beijou crianças e deficientes. "Essa proximidade e quebra de protocolos não são um desejo de ser populista. É um exemplo de igreja preocupada com os pobres, Igreja mais simples e despojada" comenta dom Luiz Gonzaga.
Na volta para Itália, o papa não se esquivou de um tema polêmico. Questionado sobre a homossexualidade, se despiu de qualquer arrogância e ganhou as manchetes do todo o mundo com a resposta: "se uma pessoa é gay e procura Jesus e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la?".
Com essa e outras posições, Francisco conseguiu retomar voz ativa do Vaticano na política internacional, principalmente na situações de conflito, como o beato João Paulo II ficou conhecido. Os discursos do papa argentino clamam contra as injustiças sociais, intrigas e críticas ao consumismo.
Ao mesmo tempo, tem sido frequentes os pedidos de paz no Oriente Médio, Venezuela e recentemente na Ucrânia, convocando os líderes mundiais a buscar o diálogo. Em fevereiro, mandou um recado ao Fórum Econômico de Davos, desafiando lideranças empresariais a colocar sua riqueza à serviço da humanidade, ao invés de deixar boa parte da população na pobreza.
"As portas da Santa Sé estão abertas aos países que passam por dificuldades momentâneas. No final de fevereiro, por exemplo, Papa Francisco recebeu o presidente do Haiti, que destacou a decisiva contribuição da Igreja no âmbito da educação e assistência social", pontua dom Walmor.
Tanto ativismo rendeu destaque em várias publicações. O Santo Padre foi a personalidade do ano para a revista inglesa Time, além de virar capa da revista pop americana Rolling Stone. No começo deste mês, Francisco foi indicado ao prêmio Nobel da Paz.
O pontífice quer a igreja mais comprometida, o que não significa as grandes mudanças que as pessoas querem, mas sim uma igreja que tem consciência do seu papel e que precisa escutar, debater e dialogar com o mundo", analisa dom Luiz Gonzaga.
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| Arcebispo de Belo Horizonte foi nomeado membro de Congregação no Vaticano |
Mudanças na Igreja
Pouco a pouco, Francisco vai modificando a estrutura administrativa do Vaticano, segundo sua linha de governo. Essa atitude prossegue com os novos cardeais proclamados no mês passado, que foram advertidos que o novo cargo não é um título honorífico, mas um convite ao serviço. Dois 19 cardeais criados, 16 têm direito a voto num novo Conclave e entre os nomes estão os titulares escolhidos por Francisco para cargos importantes, como o novo Secretário de Estado da Santa Sé e os prefeitos para a Congregação para a Doutrina da Fé e do Clero.
Também foram lembradas novas lideranças da Igreja mundo a fora, incluindo o arcebispo do Rio de Janeiro, agora cardeal dom Orani João Tempesta, que ficou em bastante evidência durante a Jornada Mundial da Juventude. Outro detalhe: dos novos cardeais que atuam fora do Vaticano, a maioria é de países em desenvolvimento.
Minas Gerais também foi lembrada pelo Santo Padre. O arcebispo de Belo Horizonte foi escolhido para ser membro da Congregração para as Igrejas Orientais, órgão que procuar manter a unidade da instituição. "Recebi, honrado pela confiança a nomeação para membro da Congregação, certo de que este é um convite a servir mais a nossa Igreja e ao Povo de Deus”, diz dom Wamor.
Frases do Papa Francisco
Em um ano, o papa Francisco marcou presença com algumas frases e gestos que já se tornaram célebres, criticando a mundanidade e mostrando sua proximidade com o homem comum.
- Em 16 de março de 2013, ele diz para a imprensa: "Como eu queria uma Igreja pobre, feita para os pobres!".
- Em 17 de março, durante seu primeiro Angelus, ele convida ao "perdão" e à "misericórdia": "Um pouco de misericórdia deixa o mundo menos frio e mais justo". "Nós não devemos ter medo da bondade, nem da ternura".
- Em 28 de março, ele pede aos padres que se dirijam às periferias, onde há mais sofrimento, onde o sangue é derramado". Os padres "não devem ser colecionadores de antiguidades", nem "funcionários públicos". Quando aos bispos, não são nem "apologistas, nem cruzados", "eles devem se impregnar do odor de seu rebanho".
- Em 17 de abril de 2013, durante missa em Santa Marta: a Igreja "não deve ser uma babá que nina uma criança para que ela durma".
- Em 8 de maio de 2013, ele convida milhares de religiosas a uma "castidade fecunda (...) A pessoa consagrada é uma mãe, deve ser mãe e não uma solteirona".
- Em 8 de julho de 2013, durante viagem a Lampedusa, ele chama atenção para o drama dos migrantes que atravessam o Mediterrâneo: "a cultura do bem-estar nos torna insensíveis aos gritos do próximo" e "culmina numa globalização da indiferença".
- Em 29 de julho, no avião que o levava de volta à Itália após sua viagem ao Brasil, ele diz para a jornalista brasileira Ilze Scamparini: "se uma pessoa é gay e procura Jesus e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la?"
- Em 4 de outubro de 2013, ele denuncia o "perigo da mundanidade": " o cristianismo sem a cruz, sem Jesus, sem despojamento é como uma confeitaria, um lindo bolo".
- Em 26 de novembro de 2013, ele denuncia a especulação financeira: "uma nova tirania invisível impõe leis de uma maneira unilateral e implacável".
O Papa marca presença também por seu gosto pelas multidões, seus gestos espontâneos com relação aos enfermos, aos deficientes que são carregados para que ele os beije. O padre deve saber "levar o carinho de Deus", diz Francisco, que não hesita em brincar, colocar uma criança no papamóvel, tirar o solidéu branco para colocar um novo, ofertado por um fiel, vestir uma camisa de futebol ou compartilhar um chimarrão.
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| O vento adora pregar peça nos papas |
Ele alterna gestos simples e gestos fortes como quando lavou, em 29 de março, os pés de 12 detentos - dentre os quais dois muçulmanos - ou quando ele liderou, em 7 de setembro, um dia de jejum pela paz na Síria.
Francisco é conhecido ainda em pregar "peças" nos fiéis e religiosos. O Santo Padre telefona e escreve de punho próprio para dezenas de pessoas. No começo do ano, ligou de surpresa para as freiras de um convento espanhol. Como nenhuma irmã atendeu, deixou um recado na secretária eletrônica: "O que será que as irmãs estão fazendo, que não podem atender? Aqui quem fala é o Papa Francisco. Eu queria cumprimentá-las neste final do ano. Mas à tarde eu posso voltar a ligar. Que Deus as abençoe."
OPINIÃO DOS CATÓLICOS
"Vejo o trabalho do Papa Francisco na frente da Igreja como um estímulo muito grande ao desafio que tenho como bispo. Preciso também ficar próximo do povo".
Dom Luiz Gonzaga Fechio, bispo-auxiliar de Belo Horizonte
"O papa Francisco é para mim um exemplo de humildade e simplicidade. Com ele eu apendro que o seguimento de Cristo não é nada complicado, mas requer de nós apenas mansidão e sinceridade".
Juçara Ribeiro França, farmacêutica - Foi voluntária na JMJ no Rio de Janeiro
"Papa Francisco é a grande referência de comunicação hoje, me surpreendo quando vejo pessoas longe do cotidiano católico o referenciando. Sem dúvida o mundo apaixonou por ele"
Fábio Machado, jornalista - Governador Valadares/MG
"Papa Francisco é uma benção para a Igreja e para o mundo. Apesar de ser Jesuita de formação, ele assimila como ninguem o pensamento franciscano: Evangeliza com exemplos e quando precisa ele usa as palavras"
Vitório Evangelista Chaves, membro da comunidade católica Reviver - Belo Horizonte/MG
"O papa Francisco demonstra uma grande habilidade de conciliar a vivência de uma fé simples, profunda, ao mesmo tempo tolerante, com abertura ao diferente".
Leandro Gomes, sociólogo - Belo Horizonte/MG
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| Multidão voltou a lotar a Praça de São Pedro |
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