A sanfona de Sávio é de 60 baixos, uma Michael toda cromada, que pesa oito quilos. O jovem, que começou tocando teclado aos quatro anos, realiza shows por todos os lugares do Município
FOTO: ANTONIO CARLOS ALVES
"Sanfona Brasileira toca a alma da gente". A frase de Dominguinhos, um sanfoneiro que deixou saudades nos meios musicais, principalmente do caboclo do sertão, permanecerá viva na mente de todos por muito tempo. É o que promete Sávio do Acordeom, de 14 anos, residente em Canindé, sucesso na sua cidade de origem e na região. Sávio já tocou para astros da música, com destaque para Waldonys e Vicente Nery.
Ao instrumentista, o que realmente interessa é estar abraçado ao fole. "A sanfona faz parte do corpo. O sanfoneiro sem sua sanfona está aleijado, lhe falta um pedaço", afirma o jovem.
Empolgado com a apresentação do menino no dia 3 de fevereiro em Canindé, por ocasião do dia do Romeiro, o prefeito Celso Crisóstomo disse que vai criar uma casa da música na cidade. O objetivo é absorver artistas de vários meios culturais, como sanfona, flauta, violão, guitarra, baixo, entre outros instrumentos. "Precisamos proteger nossos jovens da ociosidade e das drogas. Uma casa de música incentiva muita gente, porque a música educa e alimenta a alma", entende o prefeito.
O garoto Sávio começou tocando teclado aos 4 anos de idade. Com o passar do tempo, migrou para a sanfona, com um instrumento de brinquedo. Depois, encarou uma sanfona de 120 baixos, emprestada pelo sanfoneiro Estevão do Acordeom e, hoje, tem seu próprio instrumento, doado por um grupo de amigos. Sua sanfona é de 60 baixos, uma Michael toda cromada, que pesa oito quilos. Sávio realiza shows por todos os lugares do Município. Sua última apresentação foi ao lado do músico Vicente Nery, no dia 3 de fevereiro, na Praça da Igreja de Nossa Senhora das dores, para um público de mais de três mil pessoas.
O menino, que imita Luiz Gonzaga nas vestimentas, se apresenta com gibão e chapéu de couro, toca Asa Branca, Sala de Reboco, Estrada de Canindé e Assum Preto, dentre outros sucessos. Tem um sonho confessadamente pouco modesto: ser o herdeiro do Rei do Baião.
"É como dizia Luiz Gonzaga: a sanfona é o instrumento que tem o traço cultural do povo, como o violão para a Bossa Nova, o pandeiro para o sambista do morro, o piano para o músico erudito. Com uma vantagem: a sanfona é o instrumento que fica mais perto do coração", observa Sávio do Acordeom.
Agora, o sanfoneiro vai passar por três meses de aulas teóricas e práticas, onde a finalidade é dotá-lo de uma arte mais apurada. "O sonho imediato é chegar ao nível de Waldonys, grande ídolo, um sanfoneiro refinado e de toque apurado", contou Sávio.
Para o chefe de Gabinete da Prefeitura de Canindé, Jander Silva, o objetivo da municipalidade agora é se adequar a Lei Nº 11.769, de agosto de 2011, que institui obrigatoriedade da música no currículo escolar. O surgimento de Sávio do Acordeom mostra o quanto a sanfona faz parte da vida do sertão. "Ele está mantendo viva uma arte muita antiga, que ganhou o coração de todos os brasileiros, que é a arte de tocar sanfona", aponta.
"O garoto têm muito futuro pela frente. Precisamos apostar nessa nova geração. Tocar sanfona é a arte das artes e ele mostra o quanto é importante defender essa cultura sertão afora", avalia o prefeito Celso.
Sanfoneiros
A história dos sanfoneiros nordestinos se estende ao longo do tempo. Há algumas datas especiais. Em 13 de dezembro de 1913, Dia de Santa Luzia, nasceu Luiz Gonzaga, em Exu (PE). Nas décadas seguintes, ele iria popularizar o baião, oferecendo um perfil definitivo à sanfona nordestina.
Patativa do Assaré disse que a sanfona e Luiz Gonzaga era o "Nordeste em carne e osso". A partir de sua obra, a sanfona tornou-se ícone da música nordestina. As primeiras sanfonas chegaram ao Nordeste no século XVI, com a vinda dos portugueses para a região.
Mas a popularidade nacional só surgiu com Luiz Gonzaga. Foi o pai, Januário, que lhe deu as primeiras aulas. Arriscava-se em pequenas apresentações. Com o tempo, percebeu a sonoridade bonita ao juntar à sanfona o triângulo e o zabumba. O fato é que a sanfona continua em alta no Nordeste, com destaque para o Ceará.
O menino afirma não ter medo e nem vergonha de nada. Aliás, é com a sanfona que ele expressa os sentimentos mais sublimes, como o amor e a fé. Católico e herdeiro de um povo religioso, vê na sua relação com o instrumento a manifestação da cultura e da identidade de sua gente. Que digam os romeiros de São Francisco.
Diário do Nordeste