“A greve geral pode ser o teste mais difícil do Governo (...)”. Esse tuíte é de
quatro anos atrás e se referia ao mandato de Dilma Rousseff. Seu autor, João Doria, é agora prefeito de
São Paulo pelo PSDB, um dos principais
aliados de Temer. Em seu novo papel, Doria se empenhou tanto nos últimos dias
para garantir o fracasso da greve que chegou inclusive a um acordo com empresas
de táxi para transportarem de graça os funcionários municipais que queiram
comparecer ao trabalho.
O que valia em 2013 para o Governo de Dilma também vale agora para o de
Temer. A greve convocada é um teste decisivo que pode marcar o futuro de um
presidente que, em seus nove meses no cargo, enfrentou uma corrida de
obstáculos da qual, até agora, saiu incinerado. Uma pesquisa de opinião
divulgada nesta semana pelo instituto Ipsos indica que apenas 4% dos
brasileiros apoiam o Governo – que se apresentava como o salvador do país
frente à crise econômica e às suspeitas de corrupção que sacudiam o PT após 13
anos no poder. A economia parou de cair, e todas as previsões são de que o PIB
do Brasil crescerá levemente este ano, após despencar 3,8% em 2015 e 3,6%
em 2016. Mas a situação política continua
piorando de forma irremediável.
Além da exibição de
poder sindical, o protesto de hoje será o primeiro termômetro para medir, nas
ruas, o impacto da difusão pública da “delação do fim do mundo”. As revelações
dos executivos da Odebrecht voltaram a atingir duramente o PT e seu líder, o
ex-presidente Lula, mas minaram todo o sistema político. O Governo tem oito ministros
investigados pelo Supremo Tribunal Federal, e o próprio Temer só se livrou graças à proteção legal conferida pela
Constituição, embora a Procuradoria Geral da República tenha constatado a
existência de indícios contra ele.
A reação de Temer à
investida judicial tem sido uma tentativa de enterrar a corrupção acelerando um
plano de reformas econômicas para satisfazer os únicos apoios que o Governo tem
fora da base da Câmara e do Senado: os grandes setores empresariais e as
instituições econômicas internacionais, como o FMI.
A recente visita ao
país do primeiro-ministro espanhol, o direitista Mariano Rajoy, primeiro
mandatário europeu a estender a mão a um Temer com escassa ajuda de governos
estrangeiros, serviu para ilustrar o tamanho da aposta. Temer proclamou que sua
inspiração são Rajoy e suas reformas. De fato, os dois políticos são unidos por
muitas coisas: ambos foram atingidos por escândalos de corrupção, chegaram ao
poder em meio a crises econômicas e implementaram reformas profundamente
impopulares. O espanhol se permitiu sugerir a
Temer que ignore as ruas, esqueça os possíveis danos eleitorais e
prossiga contra todas as dificuldades. Mas há uma diferença essencial entre
Rajoy e Temer: o espanhol chegou ao poder pelas urnas; já o brasileiro, por uma
manobra política parlamentar contra o Governo do qual ele próprio era
vice-presidente.
Os riscos para
Temer são enormes. O Brasil é um dos países americanos com maior tradição
sindical. A primeira greve geral remonta a 1917, e há 73 anos o então
presidente Getúlio Vargas aprovou a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT),
até agora considerada quase intocável. Até mesmo um sindicalista sem formação
acadêmica, Lula, conseguiu no início deste século alcançar a presidência do
país. Além dessas raízes históricas, a greve convocada alcançou apoios que
extrapolam o mundo sindical. Teve adesão de várias categorias: de professores
de colégios de elite a certos bispos, depois das críticas feitas pela
hierarquia católica brasileira às reformas de Temer e da carta enviada pelo papa Francisco ao presidente, reprovando alguns aspectos de sua política. No mínimo, a
paralisação do transporte – inclusive aéreo – parece garantida nas maiores
cidades. Entre os que participam do protesto, há também aliados políticos de
Temer. E esse é agora o seu principal problema. Embora na quarta-feira ele
tenha conseguido aprovar inicialmente na Câmara a reforma trabalhista, a
primeira grande modificação das velhas normas da época de Getúlio, houve
algumas deserções entre os partidos que o apoiam. Nesta quinta, um dos caciques
do PMDB rebelados contra o Governo, Renan Calheiros, voltou ao ataque e ameaçou
bloquear o projeto no Senado. Para conseguir avançar com sua grande aposta, a
reforma previdenciária, Temer precisa de uma maioria de três quintos da Câmara.
Não será fácil, sobretudo se a greve tiver sucesso e exercer maior pressão
sobre os parlamentares da base aliada que hesitam em dar o voto favorável ao
projeto. A questão da Previdência é essencial para Temer não acabar perdendo
toda a credibilidade. E para o Governo respirar um pouco neste ano e meio que
ainda falta para as eleições presidenciais de 2018.
Por Xosé Hermida
Com informações do El País - Brasil
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