18 de novembro de 2013

São Raimundo-AM completa 95 anos e Personagens relembram fase de ouro do Tufão da Colina

Se os dois clubes mais antigos do Amazonas - Nacional e Rio Negro - completaram 100 anos em 2013, outra equipe tradicional do estado 'bate à porta' do centenário. Fundado no dia 18 de novembro de 1918, oriundo do Risófolis Clube Recreativo, o São Raimundo - carinhosamente chamado de Tufão - completa 95 anos de existência.
O quadro atual - o Alviceleste amarga um jejum de sete anos -  é distinto daquele vivenciado no período mais vencedor da história do clube, que perdurou até meados dos anos 2000, mas teve início ainda na década de 90. Neste período, a equipe, de coadjuvante, passou a protagonista e representou o futebol amazonense no palco nacional. Foram cinco títulos estaduais, o tricampeonato da Copa Norte, o vice-campeonato da Série C, além de sete temporadas consecutivas na Série B. 
O GLOBOESPORTE.COM/AM entrou em contato com personagens que foram fundamentais para que o São Raimundo saísse do anonimato e alcançasse sua fase de afirmação.
Time do São Raimundo, tricampeão da Copa Norte - 2011 (Foto: Reprodução)Time do São Raimundo, tricampeão da Copa Norte 2001 (Foto: Reprodução)
O idealizador: Ivan Guimarães
Em 1996, Ivan Guimarães, ao lado de Manoel do Carmo, propos ao então presidente do São Raimundo, Orlando Saraiva,  a criação de um departamento autônomo dentro do clube. Com o aval do mandatário e de outros diretores, teve início o projeto que resultaria em um tempo de glórias ao Tufão.
Na época, o clube amargava quase três décadas sem título, sem falar na situação delicada com atraso de salário aos jogadores. O primeiro passo foi a contratação do técnico Aderbal Lana, que havia trabalhado na Arábia Saudita. Num primeiro momento, a base montada foi toda de jogadores do Amazonas e, com o passar dos anos, poucas mudanças foram feitas. O segredo do sucesso? Comprometimento e manter a base da equipe.
Ivan Guimarães (Foto: Adeilson Albuquerque/GLOBOESPORTE.COM)Ivan Guimarães (Foto: Adeilson Albuquerque)
- Foi um trabalho de uma equipe. Éramos eu e o Maneca no departamento autônomo e o Lana no futebol do São Raimundo, mas por trás havia uma diretoria que deixava a gente trabalhar à vontade, não incomodava em nada. Éramos um departamento autônomo, que trabalhava no intuito de dar ao clube visibilidade, e aconteceu. O Lana foi buscando isso. Montamos uma equipe que no início não era tão boa, mas melhoramos no segundo ano e começamos a investir mais. Queríamos buscar espaço, fortalecer o elenco. A base sempre era mantida, fazíamos um ano de contrato com os jogadores - lembra Guimarães.
Durante a trajetória, o São Raimundo conquistou cinco títulos estaduais (97,98,99,04 e 06), foi tricampeão da Copa Norte (99,00 e 01) e conquistou o vice-campeonato da Série C do Campeonato Brasileiro, que levaria a sete anos consecutivos na Segunda Divisão.
- Sozinho a gente não faz nada. Fizemos o que nunca havia sido feito no futebol do Amazonas. Chegamos a Copa Conmebol, em 99. Outro dia li uma declaração que a Ponte Preta, com 113 anos de existência, pela primeira vez figura em uma competição internacional e nós conseguimos isso. Não ficamos com o título, mas terminamos em terceiro e o São Raimundo representou muito bem o Amazonas. Tínhamos que escolher entre o título da Conmebol, que estava em sua última edição, ou lutar pelo acesso a Série B. Nos dedicamos inteiramente e conseguimos o acesso junto com o Fluminense - relembra.
São Raimundo-AM (Foto: Reprodução/Futebol Amazonense)Torcida do São Raimundo comparecia em peso para
apoiar o time(Foto: Reprodução/Futebol Amazonense)
O São Raimundo, entre outros feitos, também se tornou figura constante na Copa do Brasil. Mas o sonho que mais perdurou foi o de chegar a Série A do Campeonato Brasileiro, o que nunca aconteceu.
- O financeiro foi uma das dificuldades. Não temos recursos ou tínhamos recursos como outros clubes. Nós nos bancávamos com passagem, hospedagem, alimentação, o Governo do Estado nos ajudava e tínhamos as arrecadações de jogos. Na época iam 20 ou 30 mil pessoas ao estádio torcer por nós. Faltou investimento, mais recursos para a disputa da Série A - emendou o dirigente, que acredita em uma retomada do futebol local.
- O cenário é propício, em 2014. Nada é longe do impróprio ou do impossível. Tudo é perto com dedicação e aplicação, podemos voltar a ter um time do Amazonas na Série B.
header_na_historia (Foto: arte esporte)
São Raimundo x São Paulo ''O jogo mais marcante à frente do São Raimundo foi contra o São Paulo. Eles tinham uma equipe com Ricardinho, Kaka, Rogério Ceni, Luis Fabiano. Eles vieram completos e nós não estávamos com a dupla de zaga titular. O Lana improvisou nossos defensores, mas conseguimos vencer o São Paulo por 2 a 0, no Vivaldo Lima. Depois fomos goleados no Morumbi, mas o que vale é aquilo que uma dia você fez. Era Copa do Brasil e a nossa torcida saiu maravilhada do estádio'' - Ivan Guimarães.
O capitão do tri: Donizete
Alguns jogadores marcaram a 'fase de ouro' do São Raimundo. Entre eles, Iuna, Doriva, Alberto, Marcos Pezão, Zé Ribite, Guara, Luíca e Delmo. São nomes que, até hoje, estão na memória do torcedor alviceleste, mas um em especial tinha a confiança do técnico Aderbal Lana: o volante Donizete. Nascido em Rio Claro (SP) e revelado pela Ponte Preta, o jogador, hoje aos 42 anos, passou pelo Nacional, porém se firmou com a camisa do Tufão.
Capitão da equipe, Donizete foi o responsável por erguer a taça dos três títulos da Copa Norte: em 99 contra o Sampaio Corrêa (MA), em 2000 diante do Maranhão (MA) e 2001 no triunfo sobre o Paysandu (PA). Ao relembrar da fase delicada que o time atravessava no primeiro ano do projeto - sem títulos e sem salário -, ele acredita que houve uma reviravolta na carreira de todos os jogadores. ''Fomos do inferno ao ceú''. (Veja o vídeo do título conquistado na Copa Norte de 2000).
- A verdade é que fomos do inferno ao céu. Começamos sem condição, sem estrutura, mas nosso grupo era muito bom. Todos tínhamos o mesmo objetivo. Corríamos na busca do objetivo, que era levar o São Raimundo ao lugar mais alto possível. Tudo aconteceu graças ao trabalho e a dedicação dos jogadores e do Lana. Chegamos a Série B, fomos campeões da Copa Norte. Se saímos, naquela época do inferno e chegamos ao céu, hoje, as coisas são um pouco diferentes. É triste olhar para trás e ver que fizemos muita coisa e o clube está há sete anos sem título. Mas eu acho que a nova diretoria, quem sabe, possa fazer o São Raimundo voltar - afirmou.
Donizete São Raimundo  (Foto: Reprodução/Futebol Amazonense)Donizete era o capitão do time (Foto: Reprodução
/Futebol Amazonense)
Donizete enalteceu todo o elenco da época. O ex-jogador, que atualmente trabalha na Escolinha de Futebol do São Raimundo, fez um 'apelo' e pediu que, na inauguração do estádio da Colina, o grupo seja reunido para celebrar a reinauguração no Ismael Benigno. ''Sinto falta daquele tempo. Todos fizeram uma carreira vitoriosa. O desejo é o de voltar no tempo e, honestamente, eu espero que ele volte, mas para o São Raimundo''.
- Naquela época não tinha vaidade. Independente de quem estava jogando, entrava para jogar e se doar pela equipe. Sabíamos que se tivesse um jogador suspenso, com cartão amarelo ou vermelho, iríamos ter que trabalhar dobrado, pois a doação era muito grande. Todos que jogavam, jogavam muito bem. Nosso objetivo era o de vencer.
header_na_historia (Foto: arte esporte)
Tricampeonato da Copa Norte''Não tem como não falar do tricampeonato da Copa Norte, em 99, 2000 e 2001. Foi um feito inesquecível. O São Raimundo era uma equipe lutadora, que sempre pensava em vencer. Joguei todas as seis edições da Copa Norte e consegui três títulos. É um privilégio'' - ex-volante Donizete.
O comandante: Aderbal Lana
Aderbal Lana chegou ao São Raimundo em 1996. Nessa época, o treinador já acumulava em seu currículo passagens por Nacional e Rio Negro - em ambos havia sido campeão estadual. A missão de Lana não era das mais simples.  Assinaria com um time que não gozava de tanto prestígio e que enfrentava um jejum de 31 anos sem título, mas aceitou o desafio. E veio de longe para fazer história, já que havia passado uma temporada na Arábia Saudita.
- Quando vim ao São Raimundo vim de uma escola europeia, pois treinava no exterior.  Quando cheguei no clube, sabia que eles iriam trabalhar da forma como eu queria, ou seja, só uma pessoa mandava, tinham poucas pessoas para falar. Era uma equipe que estava sem crédito e dava para iniciar um trabalho, como eu realmente queria fazer. Tive carta branca do Ivan Guimarães. Comecei fazendo um projeto com jogadores da terra - recorda.
Aderbal Lana técnico (Foto: Adeilson Albuquerque)Aderbal Lana foi o responsável por comandar a equipe do São Raimundo (Foto: Adeilson Albuquerque)










O primeiro título veio logo no ano seguinte. O elenco sofria poucas reformulações e Lana ia adequando as poucas modificações de acordo com o plantel. O resultado foi o tricampeonato Amazonense e o vice-campeonato da Série C. Tudo em um intervalo de três anos. Em 2002, Lana deixou o clube para treinar o Fortaleza (CE), todavia não demorou a retornar. Porém, o desafio era livrar o time do rebaixamento.
- Fomos tricampeões da Copa Norte e subimos da Série B, aí fui embora em 2002, mas voltei pois o São Raimundo estava ameaçado de cair. Recuperamos no segundo turno, mas o time já não era o mesmo, assim como o ambiente do clube. Muita gente dando pitaco, presidente de conselho, etc. No começo não se deu muita importância, mas quando o time começou a dar frutos financeiros aí apareceram muitos - ressalta.
O técnico não hesitou ao afirmar que o grupo era uma família. Segundo ele, isso foi traçado desde o início do planejamento, em uma situação, na luta pelo acesso a Segunda Divisão, deixou isso claro.
São Raimundo-AM (Foto: GLOBOESPORTE.COM)São Raimundo viveu melhor fase no final dos anos 90 e início dos anos 2000 (Foto: GLOBOESPORTE.COM)
- Os jogadores moravam no bairro do São Raimundo, até quem vinha de fora. Tivemos uma época de salários atrasados por três meses e tínhamos um jogo pela frente. Me lembro como se fosse hoje, fui até o campo, me reuni com os jogadores, no meio-campo, e disse: ''Estamos no meio do caminho para o objetivo e a diretoria não tem possibilidade de cumprir o compromisso conosco. Quem quiser continuar pode ficar dentro de campo, quem não quiser pode sair, pois não será julgado. É um direito do trabalhador lutar pelos seus direitos''. Ninguém saiu. Daí, em diante, meu objetivo era colocar o time na 'crista da onda', levar o torcedor ao estádio. Quando conseguimos chegar na Série B, o Ivan (Guimarães) entrou no vestiário e deu a premiação aos jogadores. Doutrinamos aquele elenco e realmente era uma família.
header_na_historia (Foto: arte esporte)
Quadrangular da Série C: ''Foi um momento especial, pois só disputamos dois anos a Série C e chegamos na decisão em 1999, junto com o Fluminense (RJ), com o Naútico (PE) e o Serra (ES). Todos diziam ''esse time chegou onde tinha que chegar'', mas nós focamos no nosso trabalho, ficamos calados. Empatamos com o Fluminense, em Manaus, e vencemos o Naútico duas vezes, aqui e lá no Recife, por 2 a 1. Se perdessemos, eles praticamente aseguravam a classificação, mas nosso time era muito bom e competitivo'' - técnico Aderbal Lana.

Por Manaus

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