Água bruta necessária destinada ao Complexo Portuário do Pecém, quando estiver em pleno funcionamento, será a metade da utilizada em Fortaleza, Eusébio, Maracanaú e Caucaia. Os quatro municípios da Região Metropolitana – que contam com população estimada pelo IBGE de quase 3,2 milhões de habitantes – têm uma demanda de 9 mil litros de água por segundo, enquanto há a previsão de que o empreendimento localizado em São Gonçalo do Amarante consumirá sozinho 5 mil litros de água por segundo.
Atualmente, o complexo consume 1,5 mil litros por segundo. Os dados são da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh) e Governo do Ceará. Em declaração no site do governo, o governador Cid Gomes anunciou os dados. “A termelétrica demandará cerca de 1.000 litros por segundo. A siderúrgica, algo em torno 1.500 litros por segundo, e a refinaria, outros 1.000 litros por segundo”.
O anúncio, em época de seca, abriu uma série de discussões sobre a gerência de água no Ceará, onde há176 municípios em situação de emergência. Com base na afirmação, o professor de Física da Universidade Estadual do Ceará (Uece) Alexandre Araújo, especialista em clima, criticou bastante o projeto, por tirar a água das pessoas e destiná-las à indústria. Para ele, algumas ações do governo para amenizar a seca estão equivocadas.
“A expectativa era que se apostasse em cisternas, poços, barragens subterrâneas e pequena e média açudagem com adutoras. O problema é que, se tivesse com o clima estabilizado, poderia funcionar. Eu realmente acho que não vai estabilizar. Então, o poder público deveria fomentar alternativas para complementar as soluções. Mas no fim das contas vai ao contrário”, reclama Alexandre.
A Assembleia Legislativa do Ceará elaborou um documento em que registra as ações do governo no combate à estiagem. A comissão responsável pelo levantamento concluiu que é necessário maior investimento em perfuração de poços com dessalinizadores, atendimento de carro-pipa e construção de adutoras. Quanto às cisternas, não há urgência, já que o material serve para acumular água pluvial. O problema é que chove abaixo da média nos últimos três anos.
De onde vem a água?
Berthyer Peixoto, chefe de gabinete da Cogerh, explica que a água fornecida para o Complexo do Pecém é de origem do açude Castanhão, o maior do América Latina. “Hoje, ele está com 2,1 bilhões de metros cúbicos de água (cada metro cúbico equivale a 1.000 litros). O volume necessário para o abastecimento humano e das indústrias até janeiro de 2015 é de 400 milhões de metros cúbicos na RMF e Complexo do Pecém. O que sobra ainda 1,7 bilhão”.
A Cogerh ainda deixa intocável o açude Orós, com 1,1 bilhão de metros cúbicos de água, para uma eventual falta de água no Castanhão. Dessa forma, Berthyer assegura que haverá fornecimento de água bruta para ambos os destinos até 2016.
Quanto à crítica de que há água para indústria, mas não para as populações de alguns municípios do interior, Berthyer justifica que as obras não estão totalmente concluídas. “A siderúrgica só entra em operação provavelmente em 2015. E ela não entra em carga máxima, mas progressivamente. Já a refinaria é para 2017”.
Até lá, a esperança é de que a quadra chuvosa se regularize e que as obras iniciadas pelo governo garantam abundância de água. “Até lá o próprio Eixão vai estar em carga máxima e com certeza vamos ter sistemas hídricos reestabelecidos”.
Racionamento
Com seca perseverante durante três anos, os açudes obviamente sofreriam as consequências. E muitos secaram, comprometendo o abastecimento de alguns municípios. Para priorizar o consumo humano, a Cogerh realizou o transporte para reposição de água pela terceira vez. Em média, o custo da ação é de R$ 250 mil o quilômetro.
“Os municípios que estavam em regime diferenciado de abastecimento foram mapeados. Foi realizado estudo e levantamento para buscar alternativas para segurança hídrica. Então, planejamos trazer água de outro reservatório mais próximo para o abastecimento. A cidade de Beberibe é abastecida dessa forma”, revela Berthyer.
Agricultura
As consequências da seca também se refletiram na agricultura do Ceará. Flávio Saboya, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Ceará (Faec), apontou que há racionamento de água na irrigação, com restrição de dias, pois a prioridade é o consumo humano. “Somos a favor dessa atitude do governo, mas a situação é crítica e a tendência é piorar”.
A cultura permanente é a mais atingida, por necessita de um tempo maior de espera para colher a safra. O que é diferente da cultura temporária, que demanda pouco tempo, em média cinco meses. “Quanto às pastagens, há uma tendência do desaparecimento da nativa”.
Mesmo assim, enfatiza que os produtores aprenderam a lidar com as situações adversas. “Eles passaram a pensar duas vezes e fazer reserva alimentar, guardar comida para que os animais se mantenham no período crítico. O que resultou, pela primeira vez, no aumento de 20% a 25% da produção leiteira no estado”, finaliza.
Por Hayanne Narlla
Tribuna do Ceará
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